sábado, 9 de maio de 2009

Eu queria gomets de laranja

Sempre achei este cruzamento meio dramático, irônico, exemplar. Quando estou indo para casa, do meu lado direito tenho a prefeitura, um prédio grande, e agora que foi reformado, até simpático; Do meu lado esquerdo, uma igreja... não sei a santidade que guarda seu nome e suas portas; Em frente, uma frondosa árvore, que protege com seus galhos carcomidos a estátua do soldado. Estátua já esbranquiçada pela ação do tempo... ok, não é ação do tempo coisa nenhuma... é merda de passarinho mesmo.

No sinal do cruzamento sempre há pedintes, sempre há crianças vendendo docinhos. Não raro compro um. Compro não porque eu gosto dos docinhos, não, nem gosto muito. Das jujubas eu gosto da laranja, mas sempre vem tão pouco. Compro por uma pontinha de culpa que me cutuca.

Antes eu pedia para a criança ficar com o doce, apenas lhe dava o dinheiro, tipo esmola mesmo. Depois passei a achar essa minha atitude meio babaca, e consumido pela culpa, passei a ficar com os doces. Como a culpa ainda me afligia, por desperdiçar os doces, passei a comê-los. Muitas vezes ali, na frente da criança, para tentar mostrar que eu comprava não para ajudá-la, mas porque eu queria os doces.

Simbólico o cruzamento porque fica do lado da igreja. E quando as beatas descem, já tendo sido absolvidas de seus pecados, ao devorar a bolachinha de água com farinha, eu sou “absolvido” dos meus, devorando hóstias de jujuba de laranja. Ninguém é absolvido. Ninguém se livra assim de seus pecados. A menina ainda vende docinhos no sinal, e o camarada ainda está pendurado com cara de triste.

Irônico porque fica do lado da prefeitura. Um prédio simpático, com um slogan bem grande “cidade do amor e da liberdade”. Ok, liberdade está nos direitos humanos, amor não, é muito subjetivo. E subjetividade a gente deixa de lado. Ah, liberdade hoje em dia é meio subjetiva também. Por via das dúvidas, é melhor deixá-la de lado também.

Exemplar é a estátua do soldado. Bombardeada com caquinhas brancas. Esse sim está de acordo com o sinaleiro.

E o mundo cão ainda late, correndo atrás da roda que leva para lugar nenhum. Viajei? Só espero que não tenha sido para o México.

2 comentários:

Hary disse...

As gomets de laranja são mesmo as melhores! rss...
Vou confessar uma coisa, sempre dava uma passada aqui, assim, meio sem querer, pra ver se vc, de repente, não tinha escrito algo... :-)
Fiquei tão feliz em vê-lo de volta!

Unknown disse...

Prefiro várias juntas, assim vou percebendo a diferença sutilmente...mas o melhor da sua escrita é a descrição, nem precisava falar exatamente o local no final, logo no início já deu pra visualizar fácil ^^